sábado, 5 de março de 2011

O PERFUME
(Andrea Joy)

Ela embarcou às 13 horas. Indecisa, não sabia se ligava para ele ou se o faria uma surpresa. Há mais de três anos eles não se viam.
Ligou, ele atendeu. Ela, trêmula, disse que estava indo ao seu encontro. A cada quilômetro rodado, encurtava a distância entre eles. Foram muitos dias de indecisão: será que estava certa daquele querer? Como seria recebida? O que iria dizer-lhe? Levava em sua bagagem um vestido vermelho de esperanças.
Finalmente chegou a seu destino. Tomou um banho demorado. Sentia orgulho de sua coragem. O deslizar de suas mãos no corpo nu era uma prece. Ela o cultuava, o preparava para receber o toque de outras mãos. Duas gotas de perfume entre os seios. Vestiu aquele vestido cuidadosamente, se olhou no espelho, constatando sua sensualidade. Exuberante, foi até um orelhão. Já era noite. Ligou. Ele atendeu. Ela o chamou certa de que, com asas nos pés ele voaria ao seu encontro. Muita pretensão!...
Aquela mulher sentiu um gosto amargo descer pela garganta. Seu coração doía, o não que acabara de ouvir tinha mãos que lhe apertavam o peito.
Ela era o oposto de tudo o que ele dizia, pensou. O vestido vermelho não fazia mais sentido. As gotas de perfume já não tinham a mesma fragrância. Seus pensamentos sofreram mutações. Era o fim.
Foi embora confusa e com esperança de que aquele não fosse um equívoco, um momento de infelicidade. Estava chocada.
Todos que estavam a sua volta sorriam, bebiam. Os lábios dela, forçosamente, também esboçavam sorrisos de falsa gentileza. Seu olhar estava visivelmente triste. Ela inibia as lágrimas. Aquele dia foi o mais triste de toda sua vida. Nenhum acontecimento seria tão desolador. No entanto, ela sorria.
Dormiu a noite inteira, a dor relaxou seu corpo. Amanheceu. Alguma coisa cochichou em seus ouvidos: “Tente novamente!”... E assim ela fez. Pegou outro ônibus e foi ao encontro dele. Nem pensou na hipótese de outro não.
Ela ligou. Ele foi. Quando se viram, ficaram emocionados demais e foram castigados pelo destino. Alguém invadiu aquele momento de rara felicidade. Um intruso bateu na traseira do carro dele, atrapalhando-lhes o acontecer dos beijos, dos abraços, das palavras.
Depois do susto conversaram um pouco. Ela disse-lhe todos os porquês de estar ali. Ele queria ser frio, mas os olhos ainda brilhavam. O sorriso, quase o mesmo, o seu cheiro a excitava. Tudo que ele dizia soava como uma linda melodia. Foram apenas alguns minutos, depois de anos de espera. Ela já estava acostumada com migalhas, pensava. Voltou para casa, certa de sua loucura ausente de alegria.
Ela não mais usou aquele vestido. Está guardado, esperando uma outra chance para ser usado sem imprevistos. O perfume? ela presenteou a um casal que estava se beijando na rodoviária. Aquele jovem precisava ter sua mulher perfumada com apenas duas gotas de perfume entre os seios, pois a maneira como se olhavam e se beijavam, diziam sim para a vida, sem medo, sem culpa, sem tabus. Era óbvio o amor entre eles.
Ao entrar no ônibus ela sentiu novamente o aperto no peito e se permitiu às lágrimas.

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